domingo, fevereiro 05, 2006

DEUS E A CONSTRUÇÃO DE UM MUNDO MAIS JUSTO E FRATERNO

Num mundo em que o nome de Deus é muitas vezes invocado em vão para justificar os fundamentalismos, os preconceitos, a intolerância, o ódio e a violência, é útil centrarmo-nos em dois textos cristãos que são susceptíveis de nos inspirar no compromisso por melhores relações interpessoais e pela construção de um mundo mais justo e mais fraterno.
Refiro-me à encíclica do Papa Bento XVI significativamente intitulada “Deus é Amor” (Deus caritas est) e a reedição, pelo CRC, da Constituição Pastoral da Igreja no Mundo Contemporâneo “Gaudium et Spes” do Concílio Vaticano II, quarenta anos após a sua publicação. Refira-se que esta reedição é enriquecida com uma excelente introdução de D. Carlos A. Moreira Azevedo, Bispo auxiliar de Lisboa, que nos dá pistas para “ Reler um documento inovador, na complexidade desta hora”.
A encíclica tem como objectivo recentrar no essencial a fé e a existência cristã: “Nós conhecemos e cremos no amor que Deus nos tem”.
O documento está dividido em duas partes Na primeira aprofunda alguns dados essenciais sobre “o amor que Deus oferece de modo misterioso e gratuito ao homem, juntamente com o nexo intrínseco daquele amor com a realidade do amor humano”. Na segunda parte trata da prática eclesial do amor ao próximo.
A justiça animada pelo que designa como caridade social está no centro da política.
A Igreja, nas palavras de Bento XVI, “não pode nem deve tomar nas suas próprias mãos a batalha política para realizar a sociedade mais justa possível (…). A sociedade justa não pode ser obra da Igreja; deve ser realizada pela política. Mas toca à Igreja, e profundamente, o empenhar-se pela justiça trabalhando para a abertura da inteligência e da vontade às exigências do bem comum,”
É impossível reduzir as múltiplas pistas que abre a reflexão, conversão e acção em meia dúzia de palavras. Cada um deve confrontar-se individual e/ou comunitariamente com a encíclica, que pode ler, embora numa tradução de qualidade deficiente em http://www.ecclesia.pt/.
Gostaria também de chamar a atenção para a já referida reedição da “Gaudium et Spes”, pelo CRC, que é uma edição de grande beleza gráfica, com uma capa de Ana Oliveira Martins.
Trata-se do “documento mais inovador e mais amplo de horizontes do II Concílio do Vaticano”, como afirma no prefácio D. Carlos Azevedo, cuja leitura ou releitura “é essencial para despertar novos percursos”.
Vale a pena repetir as palavras com que a Igreja afirma a sua íntima solidariedade com toda a família humana: “As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens do nosso tempo, sobretudo dos pobres e de todos os que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo, e nada existe de verdadeiramente humano que não encontre eco no seu coração”.
D. Carlos Azevedo no seu prefácio afirma, a concluir: “Perante a realidade deste início de milénio, importará redefinir, redizer e reafirmar, reviver a responsabilidade de amar o mundo com a paixão de Cristo”.
Reveste-se por isso de grande significado o facto do CRC ter vindo a promover uma revisitação deste importante documento, através de uma série de sete colóquios e agora desta edição (vide http://www.centroreflexaocrista.blogspot.com/).
Temos que saber construir um mundo mais justo e mais fraterno a partir dos nossos próprios princípios matriciais, sejamos cristãos para quem estes textos podem ser uma boa fonte de inspiração, muçulmanos, judeus, agnósticos ou ateus.
Há uma só Terra e nela temos que aprender a viver juntos. Ninguém está a mais. Para isso é fundamental aprendermos a respeitar o outro, que faz parte da mesma família humana, no que ele tem, aos nossos olhos, de insólito, de livre e de diferente.
Para os cristãos é uma exigência de fé para quem crê que Deus é Amor mas, é também uma exigência racional para todos os homens e mulheres, que aceitam que todos os seres humanos devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.

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