domingo, dezembro 28, 2008

BOAS NOTÍCIAS PARA OS TRABALHADORES

Num período marcado pela incerteza relativamente ao futuro, os trabalhadores são o elo mais frágil, que cabe ao direito do trabalho proteger.
Da mesma forma que a crise do capitalismo financeiro levou a reconsiderar a utilização de instrumentos como a nacionalização para fazer face á crise, deverá também levar a repensar a relação do direito do trabalho com a economia.
O direito de trabalho tem de ter mais presente neste período a desigualdade estrutural nas relações de trabalho entre empregadores e trabalhadores. Se a solução não pode ser mais rigidez, terá, contudo, de ter em conta os direitos dos trabalhadores que foram sendo inscritos nas relações de trabalho, nas leis e nas constituições.
A flexibilidade nas relações de trabalho tem de ser equilibrada com a preocupação com o modelo de sociedade que está subjacente às alterações que se pretendem introduzir e, no caso português, com o respeito pelos direitos dos trabalhadores constitucionalmente consagrados.
Os trabalhadores têm motivos para considerar como boas notícias: a declaração de inconstitucionalidade pelo Tribunal Constitucional do alargamento do período experimental de 90 para 180 dias, previsto no diploma que se propõe alterar o Código do Trabalho e a recusa do Parlamento Europeu em aceitar a possibilidade de se atingir sessenta e cinco horas de trabalho semanais.
Estas decisões são um sim a uma sociedade com menos precariedade nas relações de trabalho e com maior possibilidade do trabalhador ter condições de se realizar como pessoa e como cidadão. São sinais de que há limites que não devem ser ultrapassados. Tê-los em conta não é fraqueza, é uma manifestação de sabedoria.
No primeiro caso, o Tribunal Constitucional, num Acórdão, de que foi relatora a Juíza Conselheira Maria Lúcia Amaral, e que foi aprovado por unanimidade, considerou, conforme referiu aqui que: «A referida norma pretende vir a alterar o regime vigente de duração do período experimental nos contratos de trabalho por tempo indeterminado, alargando para o dobro, a duração do período experimental nos contratos de trabalho por tempo indeterminado celebrados com trabalhadores que exercem trabalho indiferenciado.
O Tribunal Constitucional pronunciou-se pela inconstitucionalidade dessa norma por entender que a medida legislativa em juízo dificulta o acesso um bem jusfundamentalmente protegido (a segurança no emprego) e enfraquece os deveres que dele resultam para o Estado em termos tais que se apresenta violado o limite às restrições dos direitos que o artigo 18.º da Constituição consagra e que se traduz, no caso, na violação do princípio da proporcionalidade e que se traduz, no caso, na violação do princípio da proporcionalidade
».
Entretanto, o Parlamento Europeu, como António Dornelas refere aqui, aprovou uma resolução do deputado socialista espanhol Alejandro Cercas, que defende, como pode ver aqui que «a duração máxima do trabalho semanal na UE, em média anual, deve ser de 48 horas, sem excepções, propondo que o opt-out que permitiria que chegasse até às 65 horas semanais seja revogado três anos após a entrada em vigor da directiva relativa ao tempo de trabalho»
Esta votação foi saudada pela Confederação Europeia dos Sindicatos como se refere aqui.
A questão não ficou definitivamente decidida em nenhum dos casos que referi anteriormente, mas espero que estas posições sejam respeitadas.
As decisões que referimos são boas notícias para todos os trabalhadores, não apenas enquanto tais, mas também como pessoas e como cidadãos.
São também um alerta para nos interrogarmos sobre as sociedades que estamos a construir em Portugal e na Europa e sobre o que nos faz correr.
Manuela Silva, reputada economista e intelectual católica, desperta-nos aqui para as nossas responsabilidades no modelo de sociedade que estamos a construir, reflexão muito oportuna quando nos aproximamos de um novo ano.
Acabamos o ano com estas duas boas notícias para todos trabalhadores e para todos os cidadãos em geral, que se preocupam com a coesão social e com a qualidade da democracia.
Que sejamos capazes de em 2009 avançar na construção de uma sociedade mais justa, igualitária e solidária, são os votos que formulo.

domingo, dezembro 21, 2008

JESUS - UMA PERGUNTA NOS CAMINHOS DO MUNDO

Num período em que as palavras parece que nada significam, e em que pequenas farsas banais, se misturam com o sem sentido da política reduzida a puro espectáculo ou a mera prova de vida, apetece sair da máquina deste quotidiano, também na blogosfera, fazer uma pequena pausa para nos interrogarmos sobre o que nos faz correr.
Neste período do Natal, o mais importante, não é aquilo em que se acredita ou não acredita, mas a forma como se pergunta pelo significado da vida e as consequências que se tiram da resposta que cada um dá. A maior disponibilidade de tempo para estarmos sós, com a família ou os amigos, é uma oportunidade que podemos aproveitar para o fazer a experiência de que Deus é gratuito, mas não é supérfluo.
Um exemplo de uma pergunta, que sentimos como tal, é o belíssimo poema de Manuel Alegre, aqui reproduzido na íntegra, por Sofia Loureiro dos Santos e de que ela seleccionou os seguintes versos aqui:
«Eu não sei de oração senão perguntas / ou silêncios ou gestos ou ficar / de noite frente ao mar não de mãos juntas, mas a pescar (…)».
Também é a pergunta, a procura, que move os cristãos, e estou certo, outros crentes e não-crentes.
José Augusto Mourão, que podem conhecer melhor aqui, num belíssimo poema intitulado “Epifania”, começa assim a sua oração:
«Deus, foste tu que nos puseste
nos caminhos do tempo
e disseste à nossa vida, que a esperança se cumpre
atravessando a noite sem bagagens;
como os Magos à procura do presépio,
assim caminhando para ti;
que nos guie a estrela
para a prática das mãos , dos olhos e da esperança
e nos revele os perigos dos caminhos tortuosos;
(…)».
O poema, de que reproduzimos os versos iniciais, foi publicado no livro “Vazio Verde o (Nome)”, editado pelo CRC (1985), com a capa e gravuras e Eloísa Nadal, que ajudam «a nossa iniciação permanente ao combate e à dança com aquele que do princípio do tempo nos convoca para a enunciação criadora, o ofício do louvor e do protesto» nas palavras de apresentação de José Augusto Mourão.
A belíssima capa, que reproduzimos, inspira-nos a esperança como resposta à nossa procura.
Se a poesia é uma forma privilegiada de iniciação ao mistério, que nos permite compreender o que não cabe nas palavras, a música, como podem ver aqui, alarga ainda mais a nossa capacidade de compreensão.
Quando disse que o que interessa não é afirmarmo-nos como crentes ou não-crentes, mas sim a forma como respondemos à pergunta pelo significado da vida através da nossa praxis quotidiana, tinha presente, o que o teólogo J.M. González Ruiz, designou como a parábola dos ateus, Jesus ao falar do Juízo Final, por exemplo, em Mateus, 25, 31-46, evidencia que os justos no Juízo Final, são surpreendidos, porque, quando davam de comer a quem tinha fome, de beber a quem tinha sede, recolhiam quem era peregrino, vestiam quem estava nu, visitavam quem estava doente ou na prisão, não tinham consciência que era ao próprio Deus que o faziam, que Ele se identifica com cada um dos irmãos mais pequeninos.
Ao falar do Natal, quero terminar, associando-me ao que escreveu Faranaz Keshavjee, teóloga muçulmana ismaelita, hoje, no jornal Público:«É Natal porque Jesus nasceu. Mas é porque Jesus nasceu que todos os dias são dias de fazer Natal, de nos excedermos nas boas obras, seja qual for o caminho de cada um».
Para todos um bom Natal !

domingo, dezembro 14, 2008

O PS - QUE POLÍTICAS PARA O NOVO CICLO POLÍTICO?

O facto de estarmos no limiar de um novo ciclo político, com eleições no próximo ano para o Parlamento Europeu, para a Assembleia da República e para as autarquias locais, as diferentes avaliações das políticas públicas do governo socialista, a necessidade de definir novas respostas à esquerda para as rápidas mutações que se estão a verificar a nível financeiro e económico, constituem oportunidades de debates sobre o futuro entre cidadãos, com diferentes compromissos e trajectórias políticas.
A esquerda, apesar das diferenças ideológicas que subsistem, deverá ser capaz de celebrar datas como o 25 de Abril e o 1 de Maio através de iniciativas abrangentes e de se pôr de acordo sobre algumas políticas públicas para o país.
Portugal, apesar das diferentes gerações de políticas de inclusão que têm sido promovidas pelos governos socialistas, quer com António Guterres, quer com José Sócrates, continua a ter elevados níveis de pobreza, e a ser uma sociedade profundamente desigual, em que se reproduzem as diferenças sociais e em que estamos longe de poder dizer, que existe uma efectiva igualdade de oportunidades.
Muito de positivo foi concretizado pelos governos do Partido Socialista em matéria de inclusão social, mas as profundas desigualdades existentes num país com tão baixo nível médio de rendimentos, constituem um desafio essencial para o novo ciclo político. Tem que haver mais igualdade de oportunidades para todos os cidadãos, independentemente, da sua ascendência, situação económica, condição social ou território de origem.
O Partido Socialista não pode ignorar estes desafios e tem de ser capaz de merecer, de novo, a confiança dos portugueses. Ganhar a confiança passa pelas políticas promovidas pelo governo, mas também pelas políticas para as cidades, pelas propostas para o futuro papel de Portugal na Europa e no Mundo.
O Partido Socialista, envolvido nos desafios da governação, não pode deixar de ter como preocupação alargar o diálogo interno, já que todos os militantes são indispensáveis. Também deve promover o diálogo à sua esquerda, como o fez no passado. Basta ler o blogue Ladrões de Bicicletas aqui ou o que escreve Rui Tavares aqui para constatarmos que esse diálogo pode ser muito estimulante para pensar as respostas às actuais crises.
Iniciativas positivas, como a Fundação Respublica aqui terão de ser mais abrangentes na sua actuação. O debate tem também de passar pelas estruturas internas do Partido Socialista, a todos os níveis. Faz falta, como diz Ana Gomes aqui, «a reorganização da Esquerda dentro do PS para combater o “centrão dos interesses”». O próximo Congresso do Partido Socialista é uma oportunidade para alargar a unidade interna e definir novas e ambiciosas políticas para o novo ciclo político.
Que ninguém se iluda, sem o Partido Socialista, a esquerda não marcará o próximo ciclo político. Ter como objectivo tirar a maioria absoluta ao PS, como foi afirmado por Francisco Louçã, pode permitir alguns ganhos partidários ao BE, mas seria um desastre para os cidadãos portugueses ou imigrantes e para Portugal. Nada prova que o BE venha a estar disponível para fazer maioria com o PS. Nesta matéria não tenho razões para ter o optimismo do meu camarada e amigo Elíseo Estanque aqui. Se a esquerda não for capaz de se entender para governar uma cidade como Lisboa em 2009, muito menos o será para governar o país.
António Costa, numa inteligente e oportuna entrevista ao Diário de Notícias de hoje, afirma que: «Os anos da Coligação por Lisboa, primeiro com Jorge Sampaio e depois com João Soares, foram bons para Lisboa. Tenho pena que tenha acabado…» e acrescenta: «Não serei eu a inviabilizar qualquer solução deste tipo». Interrogado sobre porque é que é impossível às esquerdas unirem-se para governarem o país, diz, com prudência: «Não sei se é, foi!».
O que se verifica é que o BE, em contradição, com as afirmadas vantagens de diálogos à esquerda, rompeu com o vereador Sá Fernandes, cujo contributo tem sido muito positivo para a cidade de Lisboa, designadamente, no Plano Verde e na forma exemplar como foi resolvido o problema dos trabalhadores precários do município. A razão é muito simples. O BE não quer estar ligado ao PS na gestão do município em ano de eleições autárquicas.
A direita está, de momento, politicamente enfraquecida, mas não devemos subestimar a sua capacidade de se reorganizar em Lisboa e no país.
Não existe qualquer semelhança entre as políticas da direita e as políticas dos governos socialistas, mesmo daquelas de que discordámos e continuamos a discordar. Basta ter presente as propostas do PSD e do CDS, designadamente, a privatização da Caixa Geral de Depósitos e a menor intervenção do Estado na economia.
Cabe ao Partido Socialista a enorme responsabilidade de continuar a merecer, e em muitos casos recuperar, a confiança dos eleitores, quer pela sua acção governativa quer pelas políticas que defina para o novo ciclo político.

quinta-feira, dezembro 11, 2008

AGENDA CULTURAL (11)

O Centro de Reflexão Cristã promove, em colaboração com o Centro Nacional e Cultura, no próximo dia 16 de Dezembro de 2008, terça-feira, pela 18h horas, uma evocação do Padre José da Felicidade Alves (1925 - 1998)*, no décimo aniversário da sua morte.
Guilherme d’ Oliveira Martins, Bento Domingues, Diana Andringa, Manuel Vilas - Boas, João Salvado Ribeiro e José Luís de Matos, evocarão o seu legado intelectual, eclesial e cívico.
A sessão terá lugar no Centro Nacional de Cultura, Galeria Fernando Pessoa, Largo do Picadeiro, 10, 1.º Lisboa. Metro: Chiado A entrada é livre.
*José da Felicidade Alves, (o Padre Felicidade Alves) nasceu em 11 de Março de Março de 1925 em Vale da Quinta (Salir de Matos, concelho de Caldas da Rainha). Frequentou os seminários de Santarém, Almada e Olivais, tendo sido ordenado sacerdote em 24 de Junho de 1948.Foi entre 1949 e 1956 professor de Teologia e História da Igreja no Seminário Maior dos Olivais, em Lisboa. De 1956 a 1968 foi pároco de Santa Maria de Belém. Tendo-se empenhado com ousadia na concretização do Concílio Vaticano II e na denúncia do sistema opressivo vigente, designadamente, da guerra colonial, foi demitido de pároco de Belém pelo Cardeal Cerejeira, e proibido de exercer quaisquer actos sacerdotais, (suspensão “a divinis”), contrariando o parecer final de uma comissão de inquérito por ele nomeada, que não encontrou “razões para a pena de suspensão” e fez apelo “a ambas as partes para se reconciliarem”. Este documento só foi divulgado em 1999, aquando da publicação do livro, cuja capa reproduzimos, que foi organizado por Abílio Tavares Cardoso e João Salvado Ribeiro, e editado pela Multinova. A reconciliação com a Igreja teve lugar trinta anos depois, a 10 de Junho de 1998, por ocasião do casamento canónico na igreja da Cruz Quebrada, a que presidiu D. José Policarpo no início da sua missão pastoral como Patriarca de Lisboa. Foi autor de vários e importantes livros e um cidadão empenhado cívica, política e culturalmente. Alguns dos seus livros ainda não editados, serão publicados brevemente. Faleceu a 14 de Dezembro de 1998. A sua vida e obra será recordada com esta homenagem a que, que nos associamos, referida também aqui e aqui.

domingo, dezembro 07, 2008

REGISTO

António Alçada Baptista morreu hoje, ao princípio da tarde.
Deixou livros fundamentais como a “Peregrinação Interior” (2 volumes), “Os Nós e os Laços” ou “O Riso de Deus”. Mas não foi apenas um grande escritor, deu um contributo marcante para a cultura e para a Igreja Católica portuguesas, graças à “Aventura da Moraes”, a que me referi aqui.
António Alçada Baptista foi uma referência marcante na minha evolução espiritual, cultural e política, como escrevi aqui, apesar das diferenças de percurso. Posso dizer que a minha vida teria sido diferente se não fosse a sua intervenção
O corpo está na Igreja das Mercês, onde amanhã será celebrada missa às 14h e o funeral seguirá para o Cemitério dos Prazeres.
Que Deus, com quem teve sempre um encontro marcado, lhe dê a Sua paz no dia sem ocaso.

A CAUSA DOS DIREITOS HUMANOS

José Saramago tem afirmado que há uma causa pela qual vale a pena lutar, a dos direitos humanos, lamentando não haver mais empenho cívico na sua efectivação. Anunciou recentemente um conjunto de iniciativas da Fundação José Saramago para promover os direitos humanos que pode conhecer aqui. São actividades que merecem ser saudadas por todos os que há muito se batem pelos direitos humanos.
A luta pelos direitos humanos não é exclusivo de ninguém, de nenhuma instituição, associação, corrente religiosa ou não-religiosa, e todos temos o dever de dar o nosso contributo de forma pessoal e original.
A comemoração do 60.º aniversário da adopção e proclamação pela Assembleia-Geral das Nações Unidas da Declaração Universal dos Direitos Humanos, cujo texto integral pode consultar aqui, é uma oportunidade para nos sacudir e nos despertar para a actualidade deste combate. Se muitos dos direitos humanos foram já incorporados nas leis e foram já efectivados para muitos cidadãos, tendemos a não ver o muito que falta fazer nas democracias desenvolvidas da União Europeia.
O aumento da pobreza, da exclusão e da desigualdade social alertam-nos para o défice de combate pelos direitos humanos de todos. Estamos muito longe da concretização do programa inscrito no artigo 1.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos: «Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade».
O direito ao pão, à casa, à saúde não está assegurado a muitos seres humanos, inclusive nos Estados que compõem a União Europeia. Não nos podemos habituar a que assim seja e temos de dizer não ao intolerável.
Muitos outros direitos são quotidianamente violados, apesar da luta persistente e discreta de muitos cidadãos a cuja acção não damos o devido valor.
Manifesto a minha gratidão a todos os que se batem com risco pelos direitos humanos nas sociedades democráticas e desenvolvidas europeias. Quero deixar aqui a minha singela homenagem a duas pessoas que muito admiro pela sua luta pelos direitos humanos, que se limitaram a fazer com simplicidade o que tinham que fazer, mesmo sabendo que com isso incorriam no ódio de organizações criminosas.
Refiro-me ao escritor italiano Roberto Saviano e à magistrada portuguesa Cândida Vilar.
Roberto Saviano, que pode conhecer melhor aqui, é um escritor italiano que depois de ter publicado em 2006, o livro “Gomorra” em que denuncia a dominação da Camorra em Nápoles, passou a ser perseguido por esta organização criminosa, tendo que viver sob permanente protecção policial.
José Saramago evoca aqui, o que é a presença opressiva da Camorra no quotidiano de Nápoles. É intolerável que uma organização criminosa numa democracia possa ameaçar a liberdade ou a segurança das pessoas, qualquer que seja o país em que isso se verifique. Nenhum pretexto ideológico, religioso ou racial pode legitimar actuações que são mera criminalidade organizada.
Manifesto também a minha solidariedade à magistrada do Ministério Público, Cândida Vilar, que se viu alvo de ameaças pelo empenho que colocou na investigação e acusação dos Hammerskins.
Situações como esta mostram-nos o muito que há a fazer para garantir a todos os cidadãos o que está consagrado no art. 3.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos: «Todo o indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança da sua pessoa».
Devemos continuar a lutar pela efectivação de todo os direitos humanos, sejam direitos à liberdade, à segurança, direitos económicos ou sociais. A causa dos direitos humanos não é, repito, exclusivo de ninguém, seja de direita, esquerda ou centro, religioso, agnóstico ou ateu. Está aberta à adesão de qualquer cidadão, independentemente da sua profissão, idade ou sexo. Se muitos advogados, por exemplo, defenderam com coragem os direitos humanos enfrentado os tribunais plenários antes do 25 de Abril, muitos advogados e magistrados fazem-no hoje com naturalidade todos os dias, como o fazem muitos profissionais das forças de segurança, jornalistas, professores, em suma, cidadãos de todas as profissões, que não viram a cara para o lado quando vêem os direitos humanos a ser espezinhados.

domingo, novembro 30, 2008

ESQUECER TIMOR ?

A visita oficial a Portugal de Xanana Gusmão, Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa e Segurança da República Democrática de Timor-Leste, nos passados dias 26 e 27 de Novembro teve como pano de fundo o artigo publicado pelo jornalista e escritor Pedro Rosa Mendes no jornal Público (25.11.2008), intitulado “Timor-Leste, um país insustentável”.
Para muitos milhares de portugueses que se empenharam de diferentes formas na afirmação do direito à independência de Timor-Leste, o resultado do artigo de Pedro Rosa Mendes parece-me ser um pretexto para esquecer Timor, no meio das suas dificuldades e contradições, mais do que uma chamada à realidade ou um simples abandono de uma visão romântica sobre este jovem país.
Pedro Rosa Mendes é um excelente jornalista e escritor, como podem ver aqui, mas isso não significa que o seu texto seja a última palavra sobre Timor-Leste.
Desde há muito que tenho sérias reservas à forma como Timor-Leste tem sido gerido politicamente como podem ver aqui, nunca tive qualquer visão romântica sobre a construção do Estado timorense, mas também rejeito a facilidade com que se decreta que um Estado é um Estado falhado ou um Estado inviável.
Se aplicássemos a países europeus como a Bósnia, o Kosovo, a Albânia, a Macedónia, a Geórgia, os critérios que são adoptados para Timor-Leste poderíamos dizer que eram Estados falhados. Creio que todos eles, apesar das dificuldades que atravessam, são Estados viáveis e penso o mesmo de Timor-Leste.
Como leitor gostaria de saber mais sobre o que se passou nos atentados contra o presidente Ramos-Horta e o primeiro-ministro Xanana Gusmão, o que está por detrás das tentativas de alterar as regras do Fundo de Petróleo, sem esquecer que Timor-Leste é um Estado soberano. Nada disto desobriga os amigos de Timor-Leste, cidadãos ou Estados, de continuar a apoiar a consolidação da democracia e o desenvolvimento em Timor-Leste, que, como afirmou Xanana Gusmão, é «um pequeno país, mas que tem tudo para vir a ser grande».
O Estado português não pode ter estados de alma, tem de ler com atenção os sinais de preocupação, mas não hesitar na sua afirmação de que Timor-Leste é um Estado viável e no aprofundar da cooperação com o seu governo e outras instituições legítimas.
Foi positiva esta visita de Xanana Gusmão a Portugal, a que se segue a visita a Timor-Leste de João Gomes Cravinho, Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação. A reunião realizada na sede da CPLP, que se refere aqui foi também um passo positivo na ancoragem internacional de Timor-Leste.
Portugal e Timor-Leste manifestaram também durante esta visita o apoio a um eventual pedido de adesão da Indonésia, como observador, à CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa), o que a verificar-se, teria consequências positivas para a inserção regional de Timor-Leste, como podem ler aqui.
Quero manifestar a minha solidariedade a todos os portugueses, que estão em Timor-Leste, empenhados no seu desenvolvimento, e na construção de um Estado de Direito, que persistem no seu trabalho apesar das dificuldades, designadamente, os professores portugueses e os militares da GNR.
Torna-se difícil seguir a partir de Portugal o que se passa em Timor-Leste, e tentar ler com objectividade os acontecimentos.
Para ir acompanhando a evolução da sociedade civil e política timorense, poderão consultar este ou este blogue.
Caberá a cada um seleccionar as fontes que lhe merecem mais crédito, mas é preferível fazer juízos apressados ou até injustos a esquecer Timor-Leste, a quebrar os laços de solidariedade e de interesse mútuo que ligam os dois países.
A nossa resposta à questão que colocámos, é que não queremos esquecer Timor-Leste, as nossas causas não são fugazes e inconsequentes, confiamos na capacidade do povo timorense para construir o seu futuro, e como Luís de Camões escreveu em “Os Lusíadas” consideramos que: «É fraqueza desistir de coisa começada».

Imagem retirada do blogue da Embaixada de Portugal no Brasil aqui, onde se referem acordos recentemente celebrados entre Portugal e Timor-Leste em matéria de educação, que prevêem parcerias com televisões do Brasil.

domingo, novembro 23, 2008

ESTRATÉGIAS PARA A CULTURA EM LISBOA

Tenho defendido desde há alguns anos que Lisboa precisa de uma política cultural consequente, não elitista e participada. Pugnando por uma produção cultural com qualidade, há que valorizar as subculturas emergentes, normalmente associados a movimentos artísticos, muito jovens e muito diversos, que por vezes são relegados para uma marginalização que a cidade não pode aceitar.
Uma Lisboa cosmopolita tem de assumir a diversidade e abrir expectativas de vida com qualidade aos que nela habitam.
Considero muito positivo o desafio lançado aos cidadãos de Lisboa pela vereadora Rosália Vargas, responsável pelo pelouro da cultura em Lisboa, para participarem no processo de reflexão estratégica sobre o sector cultural, partindo de uma auscultação de diversos agentes culturais.
Após o diagnóstico, pretende-se desenhar e consensualizar as principais linhas estratégicas de actuação no campo cultural da cidade, definir programas de actuação, envolvendo os diversos actores culturais, económicos e institucionais da cidade para uma actuação comum coerente e consistente.
Pretende-se ultrapassar a situação existente no campo da cultura, em que as decisões eram tomadas sem uma base, de forma casuística e isolada.
Este é um projecto em que todos podem participar, tendo sido criado um sítio na Rede para dar conta das diferentes fases do processo de reflexão estratégica e para que possam dar o seu contributo, cujo endereço é http://cultura.cm-lisboa.pt/.
Uma das realidades que as estratégias para a cultura em Lisboa devem valorizar são as diferentes memórias da cidade, presentes na sua toponímia e inscritas, de diversa forma na vida da cidade, da Rua do Poço dos Negros e da Calçada do Poço dos Mouros aos santos negros da bela Igreja da Graça. Estão anunciadas iniciativas para recordar a presença muçulmana e judaica na vida da cidade, o que é muito positivo, mas não se deverá esquecer também a presença africana, que tem mais de quinhentos anos na cidade, de que Francisco Avelino Carvalho nos fala aqui.
A arte e a cultura podem ser veículos e instrumentos de inclusão social, se ao lado, da valorização de formas culturais profundamente enraizadas na cultura da cidade como o Fado, se criarem oportunidades para outras expressões culturais de qualidade, com que nos vêm enriquecendo os que se têm juntado aos lisboetas, vindos de outros países e/ou de outras regiões do país.
Os equipamentos existentes, designadamente, as pequenas salas de teatro das juntas de freguesia ou do município, para além das salas das colectividades, bem como o espaço público, são insuficientemente utilizados. É possível organizar programações no quadro das quais as expressões de qualidade dos migrantes tenham oportunidade de ser incluídas. Existem condições para que, através de protocolos com as escolas, se disponibilizem estes espectáculos a públicos mais jovens. As manifestações culturais de qualidade são destinadas a todos, não se destinam a públicos separados, como alguns estupidamente continuam a pensar.
Lisboa é, como o foi no passado, nos períodos em que foi uma cidade global, um espaço em que se cruzam cidadãos com diferentes identidades culturais, que vivem e trabalham lado a lado e dialogam entre si. São as pessoas que dialogam, não as culturas.
É uma cidade em que a diversidade cultural não se cristaliza em enclaves étnicos. É por isso uma cidade cosmopolita, que deve saber gerir e valorizar a diversidade. Para dar apenas alguns exemplos, a peça “Vento Leste” da actriz Natasha Marjanovic, sobre a qual podem ler aqui, a música de Nancy Vieira que podem ouvir aqui, são manifestações culturais que transportam memórias imigrantes. A música de Sara Tavares, a que já me referi aqui, que podem ouvir aqui, ou o hip hop de Sam the Kid (Samuel Mira) que podem ouvir aqui, são já expressões de culturas mestiças, que combinam diferentes inspirações de forma desenvolta e original. Todas devem ser consideradas como fazendo parte do património da cidade, mesmo quando a transcendem e permitem estabelecer laços com outra redes de cidades lusófonas, ibero-americanas ou europeias.
Muitos outros exemplos de grande qualidade poderiam ser dados de grupos teatrais, de dança, da literatura, do vídeo ou do cinema.
A diversidade cultural é uma mais-valia para a cidade, faz parte de sua imagem internacional, pode contribuir para projectar os seus grupos culturais e não tenhamos medo das palavras, criar oportunidades para as suas indústrias culturais.
Esperamos que as estratégias para a cultura de Lisboa, ajudem a potenciar e projectar toda a riqueza de criação cultural que se manifesta na cidade, afastando obstáculos burocráticos e dando-lhe visibilidade não só a nível da cidade, mas também a níveis nacional e internacional, contribuindo para a afirmação de Lisboa, novamente, como cidade global.

A imagem reproduz um quadro de Manuela Jardim, pintora, a que me referi aqui.

quinta-feira, novembro 20, 2008

AGENDA CULTURAL (10)

PARA UMA MELHORIA DA REPRESENTAÇÃO POLÍTICA
CONFERÊNCIA PARLAMENTAR


A REFORMA DO SISTEMA ELEITORAL


Assembleia da República (Sala do Senado)

4 de Dezembro de 2008

PROGRAMA

09 h 30 Abertura ~

Alberto Martins
Presidente do Grupo Parlamentar do Partido Socialista

Apresentação do Estudo “Para uma melhoria da representação política” pelos Autores:

André Freire, Professor do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE)

Manuel Meirinho, Professor do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP)

Diogo Moreira, Investigador associado do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa (ICS-UL)

Intervenções:

Manuel Braga da Cruz
Reitor da Universidade Católica Portuguesa (UCP)

Marina Costa Lobo
Investigadora do ICS-UL e Professora convidada do ISCTE

Jorge Reis Novais
Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (FC-UL)

11 h 30 Pausa para Café

Vitalino Canas
Presidente da Comissão Parlamentar de Assuntos Europeus

António Araújo
Jurista

Vital Moreira
Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (FD-UC)

Comentário final, às questões levantadas, pelos Autores do Estudo

13 h 00 Encerramento


Esta posta foi publicada por André Freire no Blogue Ladrões de Bicicletas aqui.

domingo, novembro 16, 2008

MADREDEUS & A BANDA CÓSMICA

A música é essencial à vida, convida-nos a ir para além da máquina do quotidiano, a não nos satisfazermos com as evidências, a interrogarmo-nos sobre o mistério de estar vivo, a olharmos em volta, a sermos mais livres.
Vem isto a propósito dos excelentes concertos dos Madredeus &A Banda Cósmica, que tiveram lugar no Teatro Ibérico, em Lisboa, e nos quais apresentaram as músicas que compõem o novo disco “Metafonia”.
Metafonia, o nome do novo disco desta nova formação da banda, significa para além do som que tem caracterizado os Madredeus. O que se mantém na banda é o talento e a criatividade de Pedro Ayres Magalhães. As letras e músicas de todas as canções são da autoria de Pedro Ayres Magalhães e Carlos Maria Trindade. Letras simples que falam do essencial: o amor, a saudade, a vida, a comunhão das vozes, a paz, o mar, o navio, a viagem, o paraíso, coisas pequenas, em suma, o que pode dar qualidade à vida.
Partindo das raízes musicais portuguesas, os Madredeus abriram-se a outras influências africanas e latino-americanas, contando com músicos brasileiros e angolanos. Sente-se, por exemplo, a influência do Brasil, e de Angola, cujo merengue influenciou a canção “A Estrada da Montanha”, muito bem cantada por Rita Damásio. Assumiram o património musical dos Madredeus, dando-nos novas interpretações de canções já clássicas, como, por exemplo, “O Mar”, “Ao crepúsculo - onde é que está o meu amor?”, “O paraíso”, mas abriram-se a outras sonoridades e constituíram a Banda Cósmica na qual se integraram. A música da banda tornou-se mais ousada e mais alegre, podendo ser dançada.
É interessante perceber que o projecto musical tem uma grande coerência e radicação cultural. A canção “A profecia Atlântica” lembrou-me, de imediato a profecia do reino do Espírito Santo de Joachim de Fiore, e os cultos do Espírito Santo, que tanta influência e tantas marcas deixaram na cultura portuguesa, e que, através dela, se espalharam pelo mundo, Começa assim: «Nos mares de três continentes / Está prometido viver em paz / E as diferenças das raças, das gentes / Não serem demais», E continua «E somos todos muito importantes / Em cada cara, vê-se um coração / E o riso das crianças inocentes/ é o principal». Pedro Ayres Magalhães não se inspirou directamente em Joaquim de Fiore, mas na “História do Futuro” do Padre António Vieira e na ideia de que o mundo de língua portuguesa deveria ser protagonista da paz.
Devo dizer que o facto de apreciar esta nova música dos Madredeus não significa que esqueça músicas belíssimas de outras fases, o contributo da voz de Teresa Salgueiro, músicos notáveis que lhe deram vida noutras fases, como Rodrigo Leão, ou o papel que tiveram instrumentos como o acordeão e o violoncelo.
Pedro Ayres Magalhães e Carlos Maria Trindade, com muito talento, acrescentaram novos instrumentos, e novas vozes, as vozes de Mariana Abrunheiro, Rita Damásio, sem esquecer o contributo da voz de Ana Isabel Dias, que além de tocar harpa também acompanha por vezes as outras duas vozes.
Ana Isabel Dias, a harpista, toca muito bem e enche o palco com o prazer contagiante com que o faz. O prazer da música está, aliás, muito presente na banda. Todos os instrumentos são tocados com grande mestria: a guitarra clássica, Pedro Ayres Magalhães; a guitarra eléctrica, Sérgio Zurawski; a guitarra baixo, Gustavo Roriz; percussão Ruca Rebordão; sintetizadores, Carlos Maria Trindade; violino, Jorge Varrecoso.
Foi um grande prazer ver e ouvir tocar tão bem. A harpa, o violino, e a percussão, foram as execuções que mais me tocaram.
“Metafonia” é um disco que mistura influências musicais portuguesas, como outras influências europeias, latino-americanas e africanas. A canção “Lisboa do Mar” tem a ver com o fado, mas também com o mambo, é um fado canção mambo, no dizer de Pedro Ayres Magalhães.
Só podemos desejar que muitos experimentem o prazer da música ao ouvirem Madredeus & A Banda Cósmica, ao vivo, em disco, e se possível, em DVD, e fazer votos para que sejam uma banda de referência não apenas para os portugueses, mas para toda a comunidade dos falantes de língua portuguesa.


quarta-feira, novembro 12, 2008

REGISTO

Sofia Loureiro dos Santos escreve com inteligência, bom senso e bom gosto no blogue Defender o Quadrado. Tenho manifestado várias vezes a minha concordância com algumas das suas postas. É o que faço, de novo, relativamente a Ler é saber que podem ler aqui e O modelo alternativo que podem ler aqui, que considero essenciais para analisar a contestação actual à avaliação de professores.
Tenho o máximo respeito pelos professores e considero legítimo discordar frontalmente do método de avaliação dos professores, organizar e participar em manifestações, mas considero que não vale tudo, que todas as partes estão obrigadas ao diálogo e à procura do bem comum.
Não posso também deixar de me solidarizar com a Ministra Maria de Lurdes Rodrigues face às vaias e ovos com que foi recebida por estudantes numa cerimónia em Fafe. Ninguém se iluda quem o fez ontem à Ministra, pode fazê-lo amanhã a professores.
Seja quem for a vítima, temos que dizer que são comportamentos intoleráveis.

terça-feira, novembro 11, 2008

AGENDA CULTURAL (9)

Lançamento do n.2 da ops!, revista de opinião socialista
terça feira, 11 Novembro, 18h30, Hotel Altis, Lisboa
Debate: A Questão Educativa: do básico ao superior
Com Manuel Alegre, António Nóvoa, Rosário Gama, Paulo Guinote e Nuno David
O número 2 já se encontra online.

Site da revista: http://www.opiniaosocialista.org/

domingo, novembro 09, 2008

OBAMA - É POSSÍVEL MUDAR

A eleição de Barack Hussein Obama como presidente dos Estados Unidos da América é um acontecimento que marcará positivamente o futuro deste país e o futuro da humanidade. Tentarei dar as razões da minha esperança.
A eleição de Obama, já foi referida em diversos blogues, como pode ver aqui, mas tendo-me sempre batido pela igual dignidade de todos os seres humanos e pela igualdade de todos os cidadãos, não posso deixar de dizer que esta eleição representa uma oportunidade de progresso em todo o mundo, que tem que ser aproveitada.
Afirmei durante a campanha aqui como Barack Obama tinha condições de realizar o sonho de Martin Luther King. É necessário acrescentar que o fez porque conseguiu encarnar não apenas o sonho de uma sociedade sem discriminação racial, fraterna e reconciliada consigo mesma, mas, em simultâneo, o sonho de todos os americanos, que acreditam no poder da democracia e nas oportunidades que todos devem ter para se realizar.
Barack Obama incarna, sem dúvida, a esperança e a vontade de mudança dos afro-americanos, mas nunca foi um líder étnico. Se o tivesse sido poderia ter tido alguns sucessos, mas dificilmente seria senador e muito menos Presidente dos Estados Unidos da América. Um marco decisivo na sua campanha foi o discurso que marcou a ruptura com a política étnica do pastor Jeremiah Wright, da Igreja Trinity United Church of Christ, de Chicago, que frequentava, e no qual defendeu uma união mais perfeita, mais justa mais igual, em que todos com diferentes histórias partilhem esperanças comuns num futuro melhor. Esse seu discurso, assumindo o pai, homem negro do Quénia e sua mãe mulher branca do Kansas, bem como todos os seus ascendentes e toda a história americana com suas grandezas e misérias. ´
Falemos claro, Barack Obama venceu porque despertou e encarnou a esperança de que outras políticas eram possíveis, com “Yes, we can” conseguiu mobilizar a juventude e os cidadãos de todas as origens, que se abstinham por não acreditar ser possível uma política diferente, como podem recordar aqui.
Se nós pensarmos o caminho percorrido desde que Rosa Parks, a que nos referimos aqui, recusou dar o seu lugar a um branco no autocarro, se tivermos presente a luta de Martin Luther King, se nos lembrarmos que o actor negro Sammy Davis Jr quando anunciou que ia casar com uma actriz branca, a sueca May Britt em 1960, antes da eleição de John Kennedy teve que enfrentar manifestações do Ku Klux Klan que berravam “Salvem a raça branca”, os quais acabaram por adiar o casamento para não “prejudicar” a eleição de John Kennedy, percebemos o imenso significado desta vitória para mudar o relacionamento entre todos os cidadãos.
Obama não tem soluções mágicas para os problemas dos Estados Unidos e muito menos do mundo. As suas políticas deverão ser analisadas objectivamente, mas a sua vitória, foi a do candidato, que melhores soluções apresentou para os problemas, nomeadamente, para a actual crise financeira. Pelas razões referidas pode, contudo, alimentar dinâmicas reformadoras no sentido da reconciliação entre todos os seres humanos depois de séculos de opressão, escravatura, humilhação, racismo e violência.
Em Portugal, é ainda muito desigual e pouco equitativa a participação dos portugueses de origem não-branca na sociedade e na vida política portuguesa. Depois de alguns passos na década passada, actualmente têm-se progredido muito lentamente. Não é por falta de elites com essas origens, que são já elites pós-coloniais, mas sim porque só onde o recrutamento é feito na base do mérito e do concurso é que existem oportunidades.
Na vida política, sem excepção, ou nas empresas, a regra é da cooptação e quem coopta é homem e branco e coopta aqueles com quem convive, em quem tem confiança. Além disso, o não-branco só é visível se for excluído, senão deixa de ter cor.
Como dizia, Francisca van Dunem, ilustre Procuradora Distrital de Lisboa, com a eleição de Obama, “Estamos perante um salto civilizacional. Espero que a vitória contribua para mudar a representação negativa sobre negros nas sociedades ocidentais”.
Acrescentaria, negros, ou de outras origens, muitos dos quais são portugueses, que nunca foram a África, que nunca tiveram outra terra que não esta.
O problema é este: como assegurar oportunidades para todos os cidadãos de forma equitativa, melhorando a qualidade da nossa democracia?
Uma mulher, que é uma cidadã portuguesa muito inteligente, Faranaz Keshavjee, pergunta hoje no “Público”, «Seria possível uma mulher indo-afro-muçulmana aspirar a ser Presidente da República?». A resposta à pergunta só poderá ser dada pela prática, fazendo o caminho pelo interior das instituições, aprendendo com as lições de Barack Obama, sendo capaz de encarnar a esperança e a confiança não apenas de uma qualquer minoria, mas demonstrando capacidade de reunir em torno de si uma nova maioria, não ignorando as limitações das instituições e dos aparelhos políticos, mas sendo capazes de lhes impor outras dinâmicas. «Yes, we can!»

segunda-feira, novembro 03, 2008

REGISTO

Vale a pena ler blogues! Se tem dúvidas, leia.

João Rodrigues O Estado não pode parar à porta dos bancos no Ladrões de Bicicletas aqui.

Rui Pena Pires Irresponsabilidades no Canhoto aqui.

Tomás Vasques A frase no Hoje há conquilhas, amanhã não sabemos aqui.

Miguel Abrantes Os contentores trazem as coisinhas que os alfacinhas portugueses consomem na Câmara Corporativa aqui.

Porfírio Silva Cadilhe o e capitalismo de Estado no Machina Speculatrix aqui.

domingo, novembro 02, 2008

IX CIMEIRA BRASIL-PORTUGAL CONSTRUIR UMA ALIANÇA ESTRATÉGICA

A recente IX Cimeira Brasil-Portugal, que teve lugar no passado dia 28 de Outubro de 2008, em São Salvador, no Estado da Bahia, foi um acontecimento político que vai marcar de forma decisiva a aliança estratégica que os dois países têm vindo a construir.
Sempre defendemos que é essencial promover um novo achamento entre os dois países e desenvolver o relacionamento mais directo entre os seus cidadãos, como fizemos aqui.
A IX Cimeira Brasil - Portugal é um ponto de chegada de um conjunto alargado de iniciativas políticas, culturais e económicas, iniciadas por António Guterres, que têm sido acompanhadas de um estreitar das relações económicas entre os dois países, como se pode ver, por exemplo, aqui e aqui. É, sobretudo, o começo de um ainda mais estreito relacionamento estratégico, que é essencial para participarem na construção em conjunto de uma nova ordem global.
Não podemos esquecer neste contexto a importância que teve a I Cimeira entre o Brasil e União Europeia, graças à determinação da Presidência portuguesa, que tudo fez para que se realizasse e com sucesso.
O Brasil é um dos países mais importantes no século XXI, Portugal tem uma sólida inserção na União Europeia, mas ambos os países tudo têm a ganhar se estreitarem cada vez mais os seus laços, se mantiverem sólidas alianças com todos os Estados - Membros da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) e grande solidariedade com a Ibero - América, que realizou também esta semana uma importante Cimeira.
A IX Cimeira Brasil - Portugal, cuja Declaração Conjunta podem ler aqui, foi acompanhada da assinatura de importantes acordos entre empresas dos dois países, que podem ler aqui. Quero sublinhar a concertação político - diplomática, traduzida, designadamente, na declaração conjunta de que «a crise financeira internacional requer especial atenção e oferece oportunidades para mudanças estruturais no sistema financeiro internacional», tendo sublinhado que «os países emergentes têm papel de grande relevância nas discussões sobre a reforma do sistema financeiro internacional».
José Sócrates afirmou que: «A primeira prioridade é restabelecer a estabilidade do nosso sistema financeiro como resposta de curto prazo para mitigar os efeitos da crise. Mas não temos o direito, tanto político como moral de deixar tudo na mesma. Há, portanto, uma agenda de mudança no mundo» acrescentando ainda: «esta crise assinala a derrota daqueles que condenavam a intervenção do Estado na economia, além de mostrar uma nova ordem económica global mais justa e com instituições representativas, seja no âmbito político como no financeiro», como podem ver aqui.
Lula da Silva acrescentou que o «Estado volta a ter um papel extraordinário».
Foi também reafirmado o mútuo empenho «na conclusão com êxito do Ciclo de Doha para o desenvolvimento e reiteram a importância que atribuem à retomada das negociações entre o Mercosul e a União Europeia», afastando o retomar do proteccionismo como resposta à crise.
As afirmações políticas produzidas durante a Cimeira e muitas das declarações aprovadas são muito convergentes com posições dos que à esquerda se têm preocupado com a resposta à crise do capitalismo financeiro. Este facto não pode ser ignorado e deve ser analisado, o que farei em próxima ocasião.
Outro ponto central da Cimeira e que para mim corresponde a uma questão política fundamental, foi a afirmação da importância da promoção da língua portuguesa como língua global, comprometendo-se «a envidar esforços para adoção da língua portuguesa em foros multilaterais».
É de referir que todos «os atos assinados durante a IX Cimeira já estão redigidos segundo as regras de harmonização da língua portuguesa previstas no Acordo Ortográfico entre os Estados da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP)». Esta nova aliança estratégica não pode ser apenas a nível de Estados, mas também dos cidadãos dos dois países.
É por isso uma boa notícia para os cidadãos que os Chefes de Governo se tenham congratulado com «a assinatura do Memorando de Entendimento para o Estabelecimento de Mecanismos de Consultas sobre Nacionais no Exterior, Circulação de Pessoas e Outros Temas Consulares, e ressaltaram que esse mecanismo deverá ser especialmente proveitoso para o acompanhamento sistemático daqueles temas».
Foi também saudada, com inteira justiça «o valor histórico da contribuição da comunidade portuguesa no Brasil e da comunidade brasileira em Portugal para o continuado progresso económico e social de ambos os países».
É a hora dos cidadãos darem o seu contributo para aprofundar esta aliança estratégica entre os dois países, essencial para o seu desenvolvimento, para a construção de uma nova ordem global mais justa, e para a afirmação da nossa língua comum - a língua portuguesa - como língua global.

Esta foto foi retirada do Portal do Governo aqui .

quinta-feira, outubro 30, 2008

REGISTO

É imprescindível a leitura de Tomás Vasques no Hoje Há Conquilhas, Amanhã Não Sabemos que nos explica aqui o que podemos fazer para ser Pobres, mas felizes .
Começa assim "Lisboa é uma cidade azarenta: caiu-lhe um porto na margem do rio. Ainda por cima, os Fenícios que cá chegaram, há uns largos séculos, decidiram-se pela margem norte para encostar os barcos. Podiam ter aportado à margem sul. Mas não. Vieram direitinhos às «Docas»...".Não deixe de ler o resto e de ver as fotos do porto de Roterdão.
Será que haverá quem tenha aí mais imagens dos portos da Europa?

domingo, outubro 26, 2008

QUE POLÍTICA COMUM DE IMIGRAÇÃO PARA A EUROPA?

Está a ser construída uma política comum de imigração para a Europa, sob a liderança de Nicolas Sarkozy, que não corresponde às necessidades de muitos países europeus e que suscita uma reacção cada vez mais crítica, quer das associações que defendem os direitos humanos, laicas ou religiosas, como se pode ver aqui ou aqui, de intelectuais e de partidos políticos progressistas.
Este processo tem efeitos paradoxais. Mesmo em países, como Portugal, em que se tinham verificado progressos significativos em matéria de regulação dos fluxos e de aperfeiçoamento dos mecanismos de integração, com uma progressiva despolitização das questões relacionadas com a imigração e a uma participação activa das associações de imigrantes no sistema oficial de integração, o efeito Sarkozy, já levou à realização de uma manifestação como pode ver aqui.
O facto mais significativo de uma nova politização da intervenção das associações de imigrantes, foi o tema escolhido para o III Forum, organizado pela PERCIP (Plataforma das Estruturas Representativas das Comunidades de Imigrantes em Portugal), que terminou hoje, cujo programa pode ver aqui e em que a política europeia de imigração esteve no centro das preocupações.
É natural que a política europeia de imigração se torne uma das pedras de toque das diferenças entre as diversas forças políticas europeias nas eleições do próximo ano, apesar da actual crise económica dever estar no centro das preocupações.
O Pacto Europeu sobre a Imigração e o Asilo, bem como a Directiva Retorno são compromissos, com cedências mútuas, mas que não põem termo ao debate e às divergências de perspectivas entre as correntes políticas europeias.
Não podemos considerar que o Pacto, depois das alterações que sofreu, represente o regresso à estratégia de uma “imigração zero”, hipótese que se considera “ao mesmo tempo irrealista e perigosa”, mas é evidente que não tem uma visão clara e assumida do papel decisivo da imigração para o desenvolvimento da Europa. Refere apenas timidamente que existem Estados-membros que “têm necessidade de migrantes devido ao estado do seu mercado de trabalho ou à sua situação demográfica”.
O problema mais delicado é a situação de milhões de imigrantes em situação irregular, que se estimam entre quatro a sete milhões de pessoas, que se encontram nos Estados-membros da União Europeia. No compromisso alcançado no Pacto não ficou vedado o recurso às regularizações extraordinárias, nem poderia ter ficado, tendo em conta o poder soberano que os Estados-membros mantêm de definir quem poderá ser admitido no seu território. Contudo, o Conselho Europeu acordou: “a) Limitar-se a regularizações caso a caso e não gerais, no âmbito das legislações nacionais, por motivos humanitários ou económicos;”.Esta situação cria dificuldades, particularmente, aos imigrantes não qualificados. A insistência na importância dos imigrantes altamente qualificados tem contribuído, para que se crie nas opiniões públicas europeias, a ideia errada de que só essa é necessária.
Nesta fase e antes de prosseguir na construção de uma política europeia de imigração, afigura-se necessário, por razões humanitárias e económicas de coesão social, que os Estados-membros utilizem todos os mecanismos de que dispõem para as regularizações. Todos os Estados as fazem, inclusive, a Alemanha, variando apenas no modo ou na publicidade que delas fazem.
É positivo o processo de regularização das crianças nascidas em Portugal, que frequentam o sistema escolar e dos seus progenitores, como se pode ver aqui, bem como a utilização de outras possibilidades de regularização que a lei comporta.
No contexto de crise económica europeia, os Estados que optarem por dar prioridade aos mecanismos de afastamento e expulsão relativamente aos de regularização terão de dar boas razões às suas opiniões públicas de escolhas desse tipo. Essa opção será desumana e estúpida, porque não tem em conta a difícil situação humana e familiar dos imigrantes e suas famílias, custa muito dinheiro aos contribuintes, enquanto a outra promove os direitos humanos e traduz-se na integração de novos cidadãos que contribuem não apenas com o seu trabalho, mas com os seus impostos e os seus descontos para a segurança social para a sociedade de acolhimento. Nada disto é incompatível com o aperfeiçoamento dos sistemas de controlo de fronteiras.
Estas são algumas das razões que levam associações de imigrantes, e todas as pessoas que se preocupam com a cidadania e a qualidade da democracia a estar atentos e vigilantes à forma como os Estados resolvem estas questões, contribuindo para a construção de uma política comum de imigração europeia, que respeite os direitos humanos.

terça-feira, outubro 21, 2008

AGENDA CULTURAL (8)



Como Evitar Golpes Militares
O Presidente, o Governo e a Assembleia Eleita face à Instituição Castrense
no Estado Parlamentar, no Presidencial e no Semipresidencial
de Luís Salgado de Matos



Presidirá à sessão de apresentação o Presidente Jorge Sampaio.

O livro será apresentado por

Ø General J. A. Loureiro dos Santos, sócio correspondente da Academia de Ciências de Lisboa;
Ø Prof. Doutor Jorge Reis Novais, da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.



Sessão de apresentação no Museu Militar de Lisboa, dia 30 de Outubro, às 18 horas

domingo, outubro 19, 2008

CRISE DO CAPITALISMO? QUE OPORTUNIDADES?

Estamos numa fase de crise actual do capitalismo financeiro que levará à sua substituição, mas em que não é ainda possível antecipar o ponto de chegada. O que podemos concluir, desde já, é que os pressupostos em que assentavam as posições neoliberais que têm sido dominantes, fracassaram completamente.
A crise tem levado a profundas mudanças de atitude dos decisores políticos perante questões como a intervenção do Estado na economia, as relações entre o público e o privado, os buracos negros do sistema financeiro, que são os off-shores, como podem ver aqui. Ninguém se iluda, isto não é um intervalo em que se suspenderam as regras neo-liberais por uns momentos para tudo voltar a ser como era dantes.
Os melhores textos sobre a crise têm sido publicados por José M. Castro Caldas e por João Rodrigues no blogue Ladrões de Bicicletas, por exemplo, aqui ou aqui, para referir apenas os mais recentes. Porfírio Silva publicou no blogue Machina Speculatrix aqui, a tradução de um importante manifesto de economistas franceses “Para uma economia institucionalista”, que “não separa a análise dos mercados da reflexão sobre o pano de fundo político e ético de uma economia. Ela acredita que as instituições económicas estão entrelaçadas com as normas políticas, jurídicas, sociais e éticas, e todas elas devem ser estudadas e pensadas ao mesmo tempo».
Immanuel Wallerstein deu uma importante entrevista ao Le Monde, de 10 de Outubro de 2008, titulada “ Le capitalismo touche a sa fin”, que poderá ler aqui.
Mesmo que não se considerem pertinentes todas as suas afirmações, não as podemos ignorar e devemos tê-las em conta na nossa intervenção política. Estou de acordo em que a crise, não é apenas cíclica, mas de sistema, que o futuro não está predeterminado, e que vivemos um período raro em que a impotência dos poderosos deixa um espaço de intervenção significativo ao cidadão, que poderá contribuir para influenciar o futuro.
A crise do capitalismo financeiro, é acompanhada, segundo Immanuel Wallerstein, do fim do ciclo político da hegemonia americana, que continuarão a ser um actor importante, mas que não poderão reconquistar a sua posição dominante perante multiplicação de centros de poder, como a Europa ocidental, a China, o Brasil e a Índia. Immanuel Walllerstein considera também que «Um novo poder hegemónico … pode ainda demorar cinquenta anos para se impor. Mas eu ignoro qual».
Vivemos um tempo de incerteza em que a crise do capitalismo financeiro, se fosse deixada à mão invisível do capitalismo, nos conduziria ao desastre e a um recuo civilizacional, a graus de exploração e desigualdade inimagináveis.
Os cidadãos, os partidos, os movimentos progressistas e os Estados podem, no entanto, contribuir para que depois da tempestade se caminhe para sociedades mais justas. O que exige uma nova economia política. A tradição da social-democracia e do socialismo democrático, economistas, como Keynes ou Galbraith, Paul Krugman, Stiglitz, têm de ser estudados, porque nos ajudam a construir as políticas necessárias para enfrentar a actual crise.
A multiplicação de centros de poder cria também oportunidades novas que têm que ser potenciadas por Portugal e pela CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa). A emergência incontestada do Brasil na nova arquitectura internacional, o crescimento acelerado de Angola, o papel estratégico no hemisfério Sul de países como, por exemplo, Cabo Verde, a presença de Portugal na União Europeia, devem estimular a criatividade dos políticos e diplomatas portugueses e de todos os países lusófonos. Existe uma oportunidade rara para os Estados-membros da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) participarem na reconstrução de um outra ordem internacional após séculos de hegemonia anglo-saxónica, desde que actuem de forma articulada e saibam fazer as alianças necessárias.
Vale a pena recordar o que cantava, Geraldo Vandré, no tempo da ditadura militar brasileira: «vem vamos embora/que esperar não é saber/quem sabe faz a hora/não espera acontecer».
Sim, nós podemos fazê-lo, não devemos perder a oportunidade rara na história de participar na criação de uma nova ordem internacional mais justa e equitativa.

sexta-feira, outubro 17, 2008

REGISTO


DIA MUNDIAL PARA A ERRADICAÇÃO DA POBREZA
No dia em que comemora o Dia Mundial para a Erradicação da Pobreza, o jornal “Público” citou um relatório da Comissão Europeia, de acordo com o qual, «Portugal apesar dos seus 1,8 milhões de pobres, é o país da União que mais progressos fez nos últimos anos na diminuição das taxas de pobreza».
Temos que concluir que não nos podemos resignar à pobreza intolerável de 1,8 milhões de cidadãos em Portugal e que é possível obter resultados na luta pela erradicação da pobreza se nos empenharmos colectivamente nesse sentido.
Como afirmámos aqui no ano passado, a erradicação da pobreza exige um maior envolvimento da sociedade civil, designadamente das organizações mais próximas do exercício da cidadania pelos mais pobres.
O sucesso das políticas sociais exige também que os pobres e os excluídos sejam incentivados a ser parte na solução, exercendo os direitos que integram a sua cidadania.
Coerente com estes princípios, considero que deve ser apoiada a Audição Pública promovida pela Comissão Nacional Justiça e Paz para Dar Voz aos Pobres a que se faz referência aqui, apelando à participação dos que se batem contra a pobreza, pelos direitos e pela cidadania de todos.

domingo, outubro 12, 2008

EDUARDO LOURENÇO - UM PENSADOR INCONFORMISTA

Nesta semana em que se verificou a consagração oficial de Eduardo Lourenço como uma das figuras cimeiras da cultura portuguesa contemporânea, com a realização do Congresso Internacional Eduardo Lourenço, por iniciativa do Centro Nacional de Cultura (CNC), como podem ver aqui, durante o qual lhe foi entregue a Medalha de Mérito Cultural pelo Ministro da Cultura, Pinto Ribeiro, quero deixar aqui registada a minha profunda admiração pelo amigo, pelo intelectual e cidadão. Gostaria também de recordar gestos e atitudes de tempos em que não gozava ainda do actual reconhecimento público.
Comecei a ouvir falar de Eduardo Lourenço quando ainda frequentava o Liceu Nacional de Viseu ao Luís Miranda Rocha, infelizmente já falecido, que falava dos seus ensaios marcados por uma saudável heterodoxia num tempo de conformismos ideológicos e culturais. Só depois do 25 de Abril comecei a acompanhar a sua persistente intervenção cívica e intelectual. Apesar de estar a viver em França, onde era professor, Eduardo Lourenço participou activamente da construção da democracia que viria a ser consagrada na Constituição da República de 1976. Integrando-se claramente no socialismo democrático, manteve uma atitude permanentemente solidária e crítica, tendo, por exemplo, acompanhado Lopes Cardoso na Fraternidade Operária, em desrespeito da orientação então definida pelo Partido Socialista, não tendo sido expulso como aconteceu com os restantes, se bem me lembro, graças à intervenção discreta, mas eficaz de António Reis.
A sua inquietação relativamente ao futuro do socialismo democrático está bem viva num livro desse período “O Complexo de Marx”, D. Quixote (1979), em que tanto está presente a sua preocupação com os jovens socialistas, apenas por meras razões editoriais este livro não lhes foi dedicado.
Eduardo Lourenço continua a ser uma figura intelectual de referência do socialismo democrático, sendo há vários anos o director da revista “Finisterra”, que passará a ser editada pela Fundação Res Publica.
Eduardo Lourenço é, sobretudo, um dos intelectuais que mais profundamente tem pensado Portugal e a sua cultura nesta profunda mutação - de país colonial a democracia pós-colonial. Livros como “Os Militares E O Poder”, Editora Arcádia (1975), “O Fascismo Nunca Existiu” D. Quixote (1976), “O Labirinto da Saudade”, D. Quixote (1978) são referências incontornáveis para pensar Portugal nesse período.
Eduardo Lourenço publicou também ensaios fundamentais para analisar de forma prospectiva o lugar de Portugal na Europa como “Nós e a Europa ou as Duas Razões”, Imprensa Nacional da Casa da Moeda (1989) e “L’Europe Introuvable Jalons pour une Mytologie Européenne”, Paris, Metaillé (1991), reflexão que persiste como podem ver aqui.
Eduardo Lourenço é também um homem profundamente generoso. Recordo-me, por exemplo, que, tendo-o convidado a falar no Centro de Reflexão Cristã e tendo-se atrasado numa homenagem a António Ramos Rosa, chegou, sem ter jantado, sem a conferência, que tinha preparado no avião quando vinha para Lisboa, e, de improviso, proferiu a magnífica conferência “Como se Deus não existisse», publicada na revista Reflexão Cristã.
Eduardo Lourenço que foi um leitor apaixonado de Kierkegaard desde a sua juventude coimbrã é o intelectual português, que tem pensado o cristianismo e os desafios com que está confrontado, com maior liberdade de espírito. Nas suas páginas, mesmo as de crítica literária, está sempre presente uma interrogação espiritual radical. Eduardo Prado Coelho em “O Cálculo das Sombras”, Asa (1997) chamou a atenção que no importante livro de ensaios “O Canto do Signo - Existência e Literatura (1957-1993)”, Presença (1994) de Eduardo Lourenço: «encontramos sugestões utilíssimas para uma historia de Deus em Portugal …».
É fundamental que não se percam os textos dispersos em que Eduardo Lourenço problematizou o cristianismo, que viessem a ser publicados e debatidos no seu conjunto. Deixo aqui um breve excerto de um sobre “A face de Deus no mundo da imagem”, publicado na revista Reflexão Cristã para incentivar a concretização desta proposta. «Há uma passagem no Evangelho que nunca leio sem uma intensa emoção - diz Eduardo Lourenço. É a passagem em que Cristo interroga Pedro - Ele, que devia conhecer como ninguém o outro naquilo que ele era efectivamente, até para o escolher como seu continuador terrestre, como propagador da sua palavra, da sua mensagem. Numa espécie de vertigem ontológica que é de resto semelhante à da suprema baixeza, como Pascal diria, e da sua humilhação final pela morte - Cristo pergunta: «Pedro, tu amas - Me? «(João, 21,15-17). Quer dizer, o Cristo mesmo não é senhor do seu amor».
Continuamos a precisar do contributo do homem generoso, do intelectual, do cidadão do pensador inconformista que é Eduardo Lourenço.

Foto retirada do sítio do Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura aqui

domingo, outubro 05, 2008

CIDADES SEM NOME - CRÓNICA DA CONDIÇÃO SUBURBANA

A jornalista Fernanda Câncio reeditou recentemente «Cidades Sem Nome - Crónica da Condição Suburbana» , na Tinta da China, que resultou de um trabalho de investigação jornalística realizado, entre 2003 e 2004, a convite da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo (CCDR-LVT), e por esta publicada em 2005.
A razão desta reedição talvez tenha a ver com o facto de estar muito bem escrito e ler-se mais como um romance do que como relatório de investigação. As suas palavras misturam-se com as palavras e as estórias de vida dos muitos habitantes com que falou na Brandoa, Bela Vista, Belas Clube de Campo ou Vila Franca de Xira. Quem ler a introdução que intitulou “O lugar deles”, que pode ler na íntegra aqui, ficará agarrado pelo livro e dificilmente deixará de o procurar ler até ao fim.
O livro é uma boa iniciação aos desafios que tem colocado a requalificação da área Metropolitana de Lisboa, que é apresentada habitualmente como a região mais rica de Portugal, mas «por detrás da média aritmética esconde-se uma realidade social contraditória», como António Fonseca Ferreira refere no prefácio.
A Área Metropolitana de Lisboa é um mundo de problemas, de desafios, mas também de oportunidades. Enganam-se os que dela retiverem apenas as notícias de factos associados a problemas de exclusão ou de criminalidade. É preciso conhecer o trabalho notável de muitos autarcas, de muitos professores do ensino básico e secundário, de muitos trabalhadores sociais, o impacto das políticas públicas e programas visando incluir os excluídos, mas sobretudo a coragem de viver e a criatividade de muitos dos seus habitantes. Ainda esta semana os “Buraka Som Sistema” lançaram o seu último disco “Black Diamond” gravado entre Lisboa e Luanda, como podem ler aqui.
É por isso que é importante ler livros como este ou ver os programas que Fernanda Câncio está a produzir para a RTP2, sobre outros bairros que designou como “a vida normalmente” a que se refere aqui, ou muito trabalhos publicados não apenas por jornalistas, mas também por académicos, como podem ver aqui.
Lisboa e os seus subúrbios são um imenso estaleiro, mas não apenas de obras públicas, de recuperação ou de construção, mas de criatividade cultural e da Nação cosmopolita em que Portugal se está a transformar cada vez mais.
Para quem teve a oportunidade, como eu, de conhecer dezenas e dezenas de bairros desde o fim dos anos 80 do século passado e participou na equipa da FAUL (Federação da Área Urbana de Lisboa) do PS que, sob a liderança de António Costa, procurou definir políticas públicas no início dos anos 90 com o objectivo de “Viver Com Qualidade”, este livro permite recordar coisas conhecidas, protagonistas, medir o que foi feito e o muito que falta fazer. De muitos outros bairros suburbanos valeria a pena falar dos que desapareceram como a Pedreira dos Húngaros (Oeiras) ou a Quinta da Holandesa (Lisboa) para dar lugar a novas urbanizações, dos que permanecem de forma diferente como a Cova da Moura (Amadora) ou que ainda permanecem como a Quinta da Serra (Loures), dos que foram construídos sobre os que desapareceram, como os Terraços da Ponte sobre a Quinta do Mocho (Loures).
Fernanda Câncio desperta-nos para a necessidade de recordarmos e vermos melhor o que tem mudado e o que permanece, ao descrever, de forma magistral, a vida em três subúrbios com diferente composição social e étnica: a Brandoa (Amadora) ligada ao êxodo do campo para a cidade; um bairro de realojamento que se transformou num gueto étnico, a Bela Vista (Setúbal); o núcleo urbano transformado e descaracterizado pela progressão descontrolada da sua população (Vila Franca de Xira), o condomínio de da classe média, Belas Clube do Campo (Sintra).
É um livro de leitura indispensável para os que querem que os subúrbios sejam cada vez mais tecido urbano, que acreditam que isso é possível com políticas públicas, que mobilizem os seus habitantes para formas mais exigentes de cidadania, considerando a profunda diversidade cultural existente como uma mais-valia para criar cidades criativas.

Capa e composição: Vera Tavares

domingo, setembro 28, 2008

PEQUENOS PASSOS PARA A INTERNACIONALIZAÇÃO DA LÍNGUA PORTUGUESA

Saudámos recentemente aqui as medidas anunciadas pelo Governo para promover a internacionalização da Língua Portuguesa.
A recente Cimeira da CPLP a que nos referimos aqui representou um grande passo em frente nesse sentido. Nos últimos meses têm sido dados pequenos passos para a internacionalização da Língua Portuguesa. Nesta semana foram dados pequenos, mas significativos passos para afirmar o empenho de Portugal na internacionalização da Língua Portuguesa por acção do Presidente da República. Saudamos a intervenção de Cavaco Silva na Assembleia-Geral das Nações Unidas, que pode ler na íntegra aqui.
É muito importante que a presidência portuguesa da CPLP tenha criado condições para que as intervenções de abertura e o debate geral da 63.ª Assembleia-Geral das Nações Unidas possam ser feitas em português tendo assegurado a tradução simultânea para as seis línguas oficiais das Nações Unidas, que são actualmente o árabe, chinês, espanhol, francês, inglês e russo. Esta iniciativa enquadra-se no conjunto de acções acordadas na VII Conferência de Chefes de Estado do Governo da CPLP, com vista à promoção do português como «língua global».
Cavaco Silva recordou que a recente Cimeira de Lisboa, na qual Portugal assumiu a Presidência da CPLP, «Permitiu ainda a definição de uma estratégia comum de afirmação internacional desse bem que partilhamos: a Língua Portuguesa – o 5º idioma mais falado no mundo, ligando Estados e povos nos cinco continentes. Uma afirmação que deverá conduzir a que o Português se constitua, cada vez mais, como língua oficial ou de trabalho de organizações internacionais».
Mas a internacionalização da Língua portuguesa tem sido estimulada por outros factos culturais e políticos, que não podemos ignorar.
A Academia de Ciências de Lisboa, cuja relevância pode perceber aqui, sob a direcção de Adriano Moreira tomou recentemente uma decisão histórica ao convidar para «Académicos Correspondentes Estrangeiros» os escritores Germano Almeida (Cabo Verde), Pepetela (Angola), o pintor Malangatana (Moçambique) e o economista Carlos Lopes (Guiné-Bissau).
O resultado das recentes eleições em Angola são naturalmente susceptíveis de múltiplas leituras, mas representam, como escreveu o escritor angolano José Eduardo Agualusa, numa notável crónica intitulada “O exemplo do rei do Congo”, Pública, de 21.09.08, «a vitória definitiva da língua portuguesa e do projecto cultural que nela se exprime». Este facto é uma enorme responsabilidade para os defensores da internacionalização da Língua Portuguesa. José Eduardo Agualusa adverte: «…os pais de milhões de crianças angolanas que hoje só comunicam em português serviam-se de um quimbundo, de um umbundo, ou de um quicongo mais rico do que aquele português que seus filhos hoje falam…», e acrescenta: «Esta erosão de pensamento, pois perder palavras é perder pensamento, da mesma forma que perder línguas é perder mundos, só poderá ser corrigida com um fortíssimo investimento no ensino do idioma português». Termina, fazendo votos «que os dirigentes angolanos….comecem a procurar desde já professores de língua portuguesa, e formadores de professores, onde quer que eles existam, seja em Portugal ou no Brasil, por outro lado que os dirigentes portugueses não sigam o exemplo de D. João III, e saibam corresponder a tais expectativas».
A pobreza do português falado não ocorre apenas em Angola, mas também em muitas áreas de Portugal e do Brasil. O português é uma língua muito rica, mas temos que reconhecer que a maioria dos seus falantes utilizam apenas um número muito escasso das suas palavras e que os dicionários portugueses, mesmo o da Academia das Ciências, são muito pobres e não têm em conta a riqueza do português escrito e falado nos diferentes países de Língua Oficial Portuguesa e que há também um enorme trabalho conjunto a promover para actualizar o vocabulário científico-técnico.
Uma das formas de enriquecer o português escrito e falado pelos cidadãos dos países lusófonos é ligar o ensino do português ao das literaturas dos escritores de Língua Portuguesa, cujos livros se revestem de enorme potencial para aumentar a capacidade cognitiva e a riqueza do vocabulário dos falantes de Línguas Portuguesa.
Como vemos estão-se a dar passos positivos, mas há muito por fazer que exige a colaboração de todos aqueles para quem a pátria é primeiro que tudo a Língua Portuguesa.

Imagem retirada do excelente blogue da Embaixada de Portugal no Brasil que pode consultar aqui.

domingo, setembro 21, 2008

DEPOIS DA CRISE, UM MUNDO PÓS-AMERICANO ?

A actual crise anuncia um longo período de incerteza e profundas mudanças. Estamos numa época em que as regras que têm vigorado no funcionamento dos mercados nacionais e internacionais estão a ser postas sistematicamente em causa, mas em que não existem ainda novas regras que marquem a emergência de um novo período na economia internacional.
Devemos ser prudentes na antecipação do futuro, até porque o futuro não está pré-escrito nos astros, mas depende muito das decisões colectivas e individuais, particularmente das dos agentes políticos mais poderosos e dos responsáveis pelo sistema financeiro internacional. Esta crise não significa o fim do capitalismo. Registamos a este propósito os excelentes posts colocados por João Rodrigues no blogue Ladrões de Bicicletas aqui e aqui que são essenciais para perceber como ideias e opções políticas erradas nos conduziram à actual crise. Se não estamos perante o fim do capitalismo parece óbvio que nada ficará como antes depois desta crise. O neo-liberalismo, a desregulação permanente, a total desconfiança na intervenção do Estado, o dogma da privatização de toda a economia e dos serviços públicos, tudo isto está a ser posto radicalmente em causa. O capitalismo que sair desta crise terá alterado muitas das suas regras de funcionamento, será uma variedade de capitalismo «mais igualitária e decente» como se defende aqui, mas não se traduzirá automaticamente na hegemonia política e cultural da esquerda.
Quando assistimos à crise do subprime nos Estados Unidos, à intervenção pública no Bear Stearns, à falência do Lehman Brothers, às intervenções públicas na Fannie Mae e na Freddie Mac, à compra pelo Bank of America da Merrill Lynch ou à concessão à seguradora AIG de 85 mil milhões de dólares pela Reserva Federal norte-americana (FED), à possibilidade do banco de investimento americano Morgan Stanley vender metade do seu capital ao fundo de investimento público chinês como pode ver aqui, devemos perguntar-nos por quem os sinos dobram ou sobre quem pagará a conta. Os sinos dobram em primeiro lugar pelos cidadãos e consumidores americanos, serão eles a pagar a conta, mas há boas hipóteses de as ondas de choque destas crises virem a repercutir-se no nosso quotidiano, em maior ou menor grau.
O Expresso, de 20 de Setembro de 2008, anuncia desde já O que Portugal vai fazer para resistir à crise referindo medidas que terão impacto sobre o quotidiano dos cidadãos, designadamente, que o crédito às famílias vai ser mais restritivo, mas também a possibilidade de, se a economia europeia entrar em recessão, as taxas de juro já não subirem mais. É necessário que os cidadãos estejam muito atentos às decisões políticas e económicas.
Não deixa, de ser irónico que, neste momento, dos Estados Unidos a Portugal, da direita à esquerda, se dê tanto destaque às questões culturais fracturantes, quando as fracturas mais graves são sociais e económicas. A esquerda não deverá distrair-se da prioridade à crise social e ignorar os alertas nesse sentido como podem ver aqui.
No meio das incertezas parece evidente que estamos a entrar numa era pós-americana, nos termos em que o coloca Fareed Zakaria no seu livro The Post-American World (2008), antes da actual crise, a qual terá, contudo, também reflexos negativos no crescimento dos países emergentes.
A emergência económica e política, entre outros países, da China (de que Jogos Olímpicos foram a sagração a nível mundial), da Índia, da Rússia e do Brasil, modificou as regras de decisão política a nível internacional. Serão cada vez mais parceiros mundiais dos Estados Unidos e da União Europeia, o que coloca desafios novos, entre os quais, a circunstância de alguns não serem democracias.
A crise não gera mecanicamente as soluções, as quais não podem ser um mero regresso a fórmulas do passado, mesmo que Keynes e Marx continuem a poder ser inspiradores. Temos de formular respostas novas, tendo a humildade de perceber que o caminho faz-se caminhando e que não trata de aplicar um pré-definido projecto socialista, mas de construir políticas públicas que concretizem verdadeiras reformas estruturais, inspiradas nos valores do socialismo democrático.

sábado, setembro 20, 2008

AGENDA CULTURAL (7)


FOTOGRAFIAS de
ANTÓNIO SAMPAIO DE CARVALHO


"MESA RESERVADA”



Inauguração - Domingo,28 de Setembro de 2008
das 17h30 às 19h30
Espaço do Restaurante Sabor e Arte
Até 1 de Novembro

Páteo da Bagatela
Rua Artilharia Um n.º51 - loja R- Lisboa




Reservar. Chegar. Sentar. Consultar. Escolher. Aguardar. Conversar ou simplesmente observar. Observar à nossa volta. Este foi o ponto de partida, a motivação para o meu trabalho. O vai e vem das listas, dos talheres, dos copos, dos vinhos, dos pratos confeccionados…

António Sampaio de Carvalho
sc38@clix.pt

domingo, setembro 14, 2008

BOAS NOTÍCIAS PARA LISBOA

Lisboa atravessa um período decisivo para o seu futuro. Depois de anos de má gestão, delapidação de recursos da responsabilidade de Santana Lopes e Carmona Rodrigues que comprometeram a sua dinâmica de progresso, a eleição de António Costa como presidente da Câmara representou a oportunidade a voltar a colocar Lisboa no mapa das mais importantes cidades europeias, como cidade global.
Entre os problemas com que António Costa se viu confrontado, avultam dois que dificultam qualquer dinâmica de mudança: um défice financeiro do município que impossibilita investimentos necessários e urgentes; uma simples maioria relativa, com dispersão da representação à esquerda, que dificulta a mobilização de todas as forças que podem contribuir para a transformação da cidade. António Costa enfrentou com determinação estas dificuldades, tendo no prazo de um ano reduzido a dívida de curto prazo de 360 milhões para 180 milhões de euros e, simultaneamente, procurado assegurar a colaboração de todos os que podem e devem contribuir para a transformação da cidade.
O acordo celebrado com Sá Fernandes e o Bloco de Esquerda tem sido muito positivo para a cidade. Sá Fernandes tem dado um excelente contributo para assegurar a integração do Plano Verde para Lisboa no futuro Plano Director Municipal.
Neste contexto o recente acordo de cooperação entre António Costa e as vereadoras Helena Roseta e Manuela Júdice do movimento CPL (Cidadãos por Lisboa), são boas notícias para Lisboa. António Costa e Helena Roseta estão de parabéns por terem colocado à frente de tudo o interesse da cidade, assegurando a realização de um programa local de habitação, que se destina, designadamente, a promover o repovoamento da cidade (Helena Roseta), e realização e um evento em 2009, que afirme «Lisboa, Encruzilha de Culturas» (Manuela Júdice).
Relativamente a este acordo vi formuladas reservas que me parecem sem sentido. Este acordo, ao contrário, do que se poderia depreender daqui por ser um acordo pós-eleitoral, não é um acordo pela negativa dirigido contra os que na Câmara representam as forças que conduziram Lisboa a uma situação de crise, é um acordo em torno de programas fundamentais para o futuro da cidade.
No Expresso de 14.09.2008, refere-se, por outro lado, que «António Costa falhou grande aliança à esquerda/PCP reafirmou indisponibilidade». É verdade que António Costa estava disponível para assegurar a colaboração do PCP, mas que o PCP continua indisponível. Esta não é uma boa notícia, mas o tempo mostrará com clareza, que o povo de esquerda, quando confrontado com a tentativa da direita de unir esforços para recuperar a Câmara, penalizará severamente o PCP, por sacrificar à sua estratégia nacional de confronto com o governo, a necessidade e a possibilidade de dar o seu contributo para dar força à mudança em Lisboa.
É significativo o facto deste acordo estar a ser recebido com esperança pelas mais diversas áreas da esquerda, como por exemplo se pode ver no que afirmaram Manuel Alegre aqui e Daniel Oliveira aqui.
As mudanças políticas em Lisboa têm coincidido com uma crescente afirmação da criatividade cultural na cidade. Num interessante artigo publicado no jornal “The New York Times” por Seth Sherwood, e republicado na edição portuguesa do “Courrier International” de Setembro de 2008, cuja leitura se recomenda vivamente, refere-se o ressurgimento de Lisboa, afirmando-se, em síntese que: «A capital portuguesa é cada vez mais, um pólo cultural de dimensão europeia. Artistas de todo o mundo expõem em Lisboa, enquanto vai crescendo a voz internacional dos criadores portugueses».
António Costa inscreveu nos seus objectivos contribuir de forma decisiva para que Lisboa seja cada vez mais uma cidade criativa.
A convergência que se verifica entre boas políticas públicas municipais e a aposta nas oportunidades que Lisboa oferece por parte de empreendedores e criadores anuncia o princípio de um ciclo de renovação e afirmação internacional de Lisboa, para o qual todos os que defendem a justiça, a solidariedade, a liberdade, a criatividade, os valores da esquerda, não se podem dispensar de contribuir.

domingo, setembro 07, 2008

AS ELEIÇÕES EM ANGOLA


As eleições para a Assembleia Nacional de Angola, nas quais 8,3 milhões de eleitores elegem 220 deputados, representam um grande passo de aproximação à democracia, que merece ser seguido com atenção e serenidade.
Representam o início de um processo imparável de democratização, porque o povo angolano demonstrou que quer construir o seu futuro com a sua participação activa.
Os angolanos levantaram-se em massa de madrugada na passada sexta-feira, cinco de Setembro, para irem votar, e esperaram a sua vez, por vezes longo tempo, nas mesas eleitorais que tardaram a abrir nalgumas zonas de Luanda.
Tendo-se verificado que 320 assembleias de voto não abriram a cinco de Setembro, devido a constrangimentos resultantes da operação logística de entrega dos materiais de apoio ao processo eleitoral, a Comissão Nacional de Eleições de Angola, conforme podem ver aqui decidiu que as eleições prosseguiriam no sábado, seis de Setembro. Foram igualmente abrangidas pela medida de continuidade da votação, as mesas que por dificuldades logísticas interromperam os seus trabalhos. O objectivo foi permitir a todos os cidadãos recenseados exercer o seu direito de voto
Foi uma decisão correcta, que pretendeu corrigir dificuldades logísticas lamentáveis, mas que não põem em causa o processo eleitoral, que decorreu com liberdade e lisura, como referiu Vital Moreira aqui.
A Comissão Nacional de Eleições de Angola veio no fim do dia seis acrescentar que «das mais de trezentas Assembleias inicialmente identificadas, apenas 48 revelaram-se problemáticas, o que levou a CNE a reagrupá-las para facilitar o processo de votação em Luanda que encerrou as 19h00 de hoje (6 de Setembro)».
A participação esmagadora dos eleitores e a sua vontade de escolher o futuro do seu país, são um factor que nenhum dirigente político angolano pode ignorar para o futuro. Depois de décadas de sofrimento, de luta pela independência, de guerra civil, de lutas fratricidas e sangrentas, inclusive no interior dos seus principais partidos, o povo angolano demonstra querer construir a democracia e demonstra uma imensa esperança no futuro.
Angola é hoje um Estado num processo de modernização, crescimento económico e democratização, apesar das grandes desigualdades sociais existentes, o que, aliás, se verifica também noutros países emergentes.
Só mais e melhor democracia, em Angola, como em qualquer país do Mundo, permitirão um desenvolvimento mais equitativo e uma drástica diminuição da corrupção.
O escritor angolano José Eduardo Agualusa, considerou, num interessante comentário, publicado no “Público”, e escrito antes do acto eleitoral: «Quaisquer que sejam os resultados das eleições…as mesmas assinalam em primeiro lugar o firme trunfo da paz. A campanha eleitoral decorreu sem sobressaltos. Ao contrário do que aconteceu em 1992 nenhum dirigente partidário subiu ao palanque de arma na mão. A imparcialidade das forças policiais foi elogiada pela generalidade dos observadores. O aspecto mais negativo terá sido a utilização pelo partido actualmente no poder das estruturas do Estado, sobretudo dos meios de informação para veicular a sua mensagem.…».
Só podemos fazer votos para que José Eduardo Agualusa tenha razão e que estas eleições representem não apenas o triunfo da paz, mas também a vitória do povo angolano, independentemente dos resultados eleitorais.
Ao ver o povo aglomerar-se nas ruas de Luanda para votar, lembrei-me da minha ida a Angola, no quadro de uma vista do então Primeiro-Ministro, António Guterres, das gentes de Luanda, Benguela, Lubango, do cheiro da terra em Luanda ao sair do avião, da chuva quente, e, sobretudo, da fraternidade com que fomos recebidos.
Não posso por isso deixar de acompanhar com emoção o desenrolar destas eleições, de felicitar o povo angolano pela sua determinação em construir a democracia e uma vida melhor para todos. Faço votos que se ultrapassem todas as dificuldades, com bom senso, para que os angolanos construam um grande país desenvolvido, justo e livre.
Imagem retirada do sítio do IPAD - Instituto Português de Apoio ao Desenvovimento daqui.